A Palestina e um vírus chamado sionismo

A Palestina e um vírus chamado sionismo

Ashjan Sadique Adi

No atual momento, temos ciência e consciência da Epidemia do Coronavírus, que assola o mundo, atingindo desde um lugar distante como a China até as nossas casas e a casa da vizinha, nos assustando todos os dias. Um fenômeno como poucos na história, e que nos faz lembrar a Gripe Russa (1889-1890), a Gripe Espanhola (1918-1919), a Gripe Asiática (1957-1958), a Gripe de Hong Kong (1968-1969), todas com milhões de vítimas fatais, na Espanhola estimadas em até 100 milhões. As mídias sociais, a televisão, os jornais, não nos deixam esquecer do Coronavírus, lembrado a cada reportagem, a cada vídeo. Mas hoje, no dia 30 de março, lembramos da data em que, no ano de 1976, a Palestina do Rio ao Mar realizou uma grande greve geral em várias de suas cidades, desde a Galileia da cidade de Nazaré ao deserto de Al Náqab, ao sul, manifestando-se em revolta contra o roubo de terras palestinas pelas mãos do governo usurpador de Israel: um descumpridor de acordos, resoluções e toda a legalidade internacional desde 1948.

Neste momento, em que a pandemia assola a todos, o sofrimento dos palestinos e palestinas tem um plus: sofrem mais porque seguem enclausurados pelos bloqueios econômico e humanitário, que impedem a entrada de alimentos, remédios, brinquedos e até temperos, sobretudo na guerreira Faixa de Gaza. Por isso, eu gostaria de falar brevemente de um vírus: o Vírus do Sionismo.

Este vírus, que gera a matança de palestinos e palestinas não por doença, mas por assassinatos, prisões, torturas, demolições e humilhações, o vírus sionista. Este vírus começou a ser produzido em 1897, quando, no I Congresso Sionista, realizado em Basiléia, Suíça, deliberaram entre a Argentina, o Sudão e a Palestina para sediarem a ideia de um estado puramente judaico, sendo esta última a escolhida para ser inoculada e tornar-se o novo Lar Nacional Judeu.

Detalhe interessante é que não consultaram os habitantes da terra Palestina a respeito da chegada dos novos “moradores”, ou melhor, os estrangeiros invasores. Sim, que invadiram e se inocularam na terra Palestina como um vírus, transmitindo por onde passava a doença de sua ocupação, travestida nas ideias de direito legítimo ou na mentirosa necessidade de segurança. Um vírus que se transmuta como defensor da luta vegana e LGBT, contaminando mais alguns com suas mentiras, que não passam de um Pinkwashing, enquanto mata e oprime palestinos/as.

E o criador deste vírus da morte foi o pai do sionismo político moderno – Theodor Herzl (1860-1904). Judeu nascido na Hungria. Que coisa curiosa: Hungria, Europa, o que tem a ver com a Palestina? Pois é, a escolheram arbitrariamente como lar, onde já havia lares, pessoas, famílias vivendo lá a pelo menos 10 mil anos, como nos comprovam e não nos deixam mentir a cidade de Jericó, com seus 10.700 anos ininterruptamente habitados.

Herzl empreendeu esforços para obter o apoio das elites judaicas e governantes europeus ao projeto sionista. Segundo o historiador israelense Avi Shlaim, em A muralha de Ferro, seu pressuposto “não declarado” e de seus sucessores era que o movimento alcançaria o seu objetivo “não através de um entendimento com os palestinos locais, mas por meio de uma aliança com a grande potência dominante do momento”. Esse parceiro seria a Grã-Bretanha, como nos fala a querida amiga de luta Soraya Misleh em seu livro Al Nakba (Sundermann, 2017).

Nakba significa Catástrofe no idioma árabe, uma catástrofe que atravessa milhões de palestinos/as, imigrantes, refugiados/as, ocupados/as. Que atravessa minha história, a história de meus pais, de meus avós, primos e primas, alguns já presos pelo vírus, a história de minha família e, de alguma forma, a história de todos/as aqueles/as que lutam ou que se sensibilizam pela Libertação da Palestina.

A Nakba em 1948 foi a grande Epidemia do vírus Sionista, que se alastrou na Palestina e atingiu nossos corpos, nossa pele, nossa etnia, matou dezenas de milhares, expulsou centenas de milhares, desalojou ou deslocou outros muitos milhares. Apenas não foi e nunca será capaz de desalojar nossa luta e perseverança: a estas o vírus sionista jamais contaminará, pois são elas o nosso antídoto contra as tentativas funestas e infames de nos infectar e matar a exatos 72 anos. Vocês não conseguirão. Nós somos a insônia dos soldados assassinos de Palestinos. Vocês não dormirão, pois “nascem milhares dos nossos cada vez que um nosso cai”, como nos diz Bia Ferreira sobre as pessoas negras e sua luta.

Para finalizar, a Epidemia do vírus sionista continua cotidianamente, E JÁ SE ALASTRAVA BEM ANTES DO CORONAVÍRUS (não podemos nos esquecer disso) nas suas violências desumanas e violações de direitos mais que humanos, nas prisões, nas ocupações, no desrespeito cotidiano a mulheres, crianças e anciãos. Mas resistimos, pois, o Palestino é, acima de tudo, um forte. E parafraseando o grande poeta da resistência palestina Mahmoud Darwish, se há um mal do qual não temos cura, este mal se chama Esperança. Até a Vitória!!!

Ashjan Sadique Adi (foto acima): Palestina-brasileira, psicóloga social, doutoranda pela USP, ativista pela Palestina e Diretora da Secretaria de Mulheres da Federação Árabe-Palestina do Brasil (FEPAL).

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